A Primeira Câmara do Tribunal de Contas de Minas Gerais referendou hoje, 23 de novembro, decisão liminar concedida pelo relator, o conselheiro Durval Ângelo, nos autos da representação n. 1.092.628, oferecida pela procuradora de contas Cristina Andrade Melo.
A representação foi oferecida em razão de possível ilegalidade no contrato celebrado entre o município de Santa Rita do Sapucaí e escritório de advocacia, mediante inexigibilidade de licitação, e que previa utilização de recursos provenientes do extinto FUNDEF para pagamento de honorários advocatícios contratuais.
Considerando que o Tribunal de Contas da União já se manifestou (Acórdão 1.824/2017) no sentido de ser proibido o destaque de verba do precatório do FUNDEF para pagamento de honorários e, considerando que o contrato celebrado entre o município e o escritório previa um destaque de 15% sobre o que fosse auferido pelo município, a procuradora de contas requereu liminar para impedir que fosse feito qualquer pagamento ao contratado, direta ou indiretamente, por meio de requerimento judicial de desmembramento de eventual precatório, até que o mérito da representação seja definitivamente julgado, sob pena de a despesa ser considerada irregular e o gestor ser responsabilizado pessoalmente.
No mérito, a procuradora requereu a anulação parcial do contrato, com a estipulação de uma nova cláusula com previsão de pagamento da parcela dos honorários com recursos municipais próprios e desvinculados.
Entenda sobre o FUNDEF:
O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF) foi instituído pela Emenda Constitucional n. 14, de setembro de 1996, regulamentada pela Lei Federal n. 9.424, de 24 de dezembro do mesmo ano e pelo Decreto Federal n. 2.264, de junho de 1997. O FUNDEF foi implantado, nacionalmente, em 1° de janeiro de 1998, quando a nova sistemática de redistribuição dos recursos destinados ao Ensino Fundamental passou a vigorar.
A instituição do FUNDEF inovou ao alterar a forma de financiamento do Ensino Fundamental (1ª a 8ª séries do antigo 1° grau) vinculando parcelas de recursos para esse nível do ensino em todo país.
O FUNDEF foi sucedido pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB), nos termos da Emenda Constitucional n. 53/2006, consoante nova redação do art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Com a alteração da ordem constitucional, foi editada a Lei Federal n. 11.494/2007, regulando o FUNDEB.
Com relação ao extinto FUNDEF, instalou-se acirrada discussão acerca da forma de cálculo do VMAA, valor mínimo anual por aluno, que é o índice eleito para dimensionar o desembolso financeiro da União, a título de complementação para o sistema de ensino fundamental, de custeio prioritário de Estados e municípios, de modo que toda a controvérsia se relaciona à interpretação do art. 6º, caput e § 1º da Lei n. 9.424/1996, vigente à época em que a complementação era devida.
Neste cenário, em outubro de 1999, o Ministério Público Federal ajuizou na Justiça Federal de São Paulo a Ação Civil Pública n. 1999.61.00050616-0[1], argumentando, em síntese, que seria devida aos municípios, nos exercícios de 1998 a 2006, a complementação em razão das diferenças no cálculo do VMAA.
A ação civil pública foi julgada parcialmente procedente e a União foi condenada a ressarcir aos municípios os valores não pagos em razão da diferença no cálculo do VMAA.
Nesse momento, diversos municípios brasileiros ajuizaram ações de cumprimento de sentença para pleitear seu direito ao ressarcimento, via precatório.
No entanto, constatou-se que, em centenas de casos, foram contratados escritórios de advocacia cujo pagamento dos honorários advocatícios se daria com verbas destacadas de eventual precatório ao qual os municípios fariam jus.
A questão tem relevância porque envolve desvio de finalidade de verbas vinculadas à educação e, a forma de pagamento tal como pactuada, configuraria irregularidade gravíssima, pois ensejaria o desvio de verbas “carimbadas” do FUNDEF que, ao invés de serem utilizadas na manutenção e desenvolvimento do ensino, seriam utilizadas para pagamento de honorários advocatícios.
Em razão da natureza jurídica do FUNDEF, os
recursos devidos aos municípios em razão da complementação do VMAA devem ser
aplicados exclusivamente na manutenção e desenvolvimento do ensino fundamental
público e na valorização do magistério, uma vez serem recursos vinculados à
educação, não havendo espaço para discricionariedade quanto à sua destinação.
[1] Disponível em: <http://www.jfsp.jus.br/foruns-federais/?numeroProcesso=199961000506160>. Acesso em: 19 mar. 2019.